Montag, 31. August 2009

O impacto pela confrontação de ciência e fé cristã

Atualmente assistimos a um exemplo impressionante, que nos mostra como a evolução do homem continua, quase a cada dia, mais rapidamente:com a nossa técnica, já alcançamos até planetas dos quais nos separam distâncias fora da nossa imaginação. Voamos com um macroavião, decolando em Paris, que facilmente alcança Buenos Aires ou Santiago do Chile. Mas, ao mesmo tempo, em nosso planeta, sofremos de dilúvios de uma força e de unia extensão inédita. E a mídia nos faz relembrar também que, ao lado de nosso mundo moderno, há tribos nas ilhas entre a Índia e a Tailândia, no oceano, que atiram de arco e flecha contra helicópteros do governo central que tentam trazer socorro numa situação de catástrofe. Primitivos, como os encontramos também hoje nas margens do Amazonas. Temos duas culturas lado ao lado, como, aliás, já acontecera na época do descobrimento do Brasil: temos o primitivo e o civilizado.

O índio imaginava um mundo bem diferente daquele que concebiam os brancos, com seu modo materialista, determinado pela Matemática e Física. O índio dava alma ao pássaro e atribuía poderes espirituais e divinos à planta que o curava. Também seu céu lhe parecia um lugar povoado por gente vivendo em bonitas aldeias cercadas de árvores frutíferas. E, em meio a sua tribo, iria um dia fazer parte dessa terra sem mal.

Além das coisas visíveis e da realidade aparente na humanidade, existiram sempre a imaginação, o sonho e o mito, O mito cria modelos de comportamento humano, valorizando desta maneira a existência do homem. Uma de suas mais importantes funções é a criação de modelos de ritos e atividades essenciais para a alimentação, o casamento, o trabalho, a educação, a arte e a ciência. O mito propicia a realização daquilo que os homens imaginam em seus mais bonitos sonhos. No mito, as coisas essenciais, espaço e tempo, se transformam e ganham uma dimensão ideal e mágica. O mito tem um valor religioso (Vide Natalicio Gonzalez, Proceso y Formacion de lá Cultura Paraguaya, Asunción, 1998).

Na pré-história, por assim dizer, reconhece-se a função da inteligência singular do ser humano e emerge desta supremacia sobre o resto das criaturas a religião, como dela também emerge a ciência. Trata-se de gêmeos! Note-se que a religião não se utiliza de outros meios senão da razão e da língua, como destacou Herder.

É importante sublinhar um fato fundamental: não há e, desde os primórdios da humanidade, não houve inimizade entre estes gêmeos, entre a religião e a ciência. Muito ao contrário: o que, de fato, observamos, é que há e sempre houve uma forte interdependência entre elas.

Tratemos mais de perto o tema da interdependência entre a religião e a ciência, a partir da Idade Moderna até o surgir do neoprotestantismo e da teologia neoliberal:

A stoa, com seu intelectualismo e racionalismo, desenvolveu as formas clássicas das provas da existência de Deus: o argumento cosmológico, teleológico e ontológico, todos válidos até Kant, como disse Kurt Leese (Recht und Grenze der natürlichen Religion, p. 20). Já na stoa encontramos todos os elementos mais tarde expostos na theologia naturalis da Igreja Católica, como os há também nos escritos de S. Paulo e, no Velho Testamento, na coleção apócrifa da Sabedoria de Salomão. Os apologistas Justino o Mártir ou Clemens Alexandrinus, ambos educados em ambiente grego, e os patriarcas da Igreja adaptaram a theologia naturalis, proveniente da filosofia do estoicismo, propositadamente. Lemos, no Dialogus cum Tryphone, de Justino, diz: a Filosofia é, sem dúvida alguma, o tesouro mais precioso e, aos olhos de Deus, o mais importante, pois é só ela que leva o homem a Ele. Os apologistas e padres antignósticos atribuíam aos pensamentos filosóficos dos gregos um valor extraordinário dentre o contexto da teologia da revelação. Isto se nota claramente na fórmula de Tertuliano: anima naturaliter christiana. No decorrer dos tempos, a Igreja Católica-Romana aperfeiçoou esta theologia naturalis e, no Vaticano 1, a confirmou por meio do dogma: Salta máter eclesial tente ac doce, delfim riram omnium principium et finem, naturali rationis lumine e rebus creatis certo cognosci posse.

Mediante a história da religião conhecemos o impacto dos cultos religiosos contextuais - do Egito, via Síria, Arábia, Babilônia, Assíria, até a Pérsia - na vida dos israelitas. Nas escrituras integrantes do Velho Testamento encontram-se milhares de respectivas referências. Tais influências manifestaram-se, antes de tudo, nas mitologias dos anjos e na narração do dilúvio - tudo isso provém da mitologia persa. Temos também a literatura da sabedoria, por Goldammer classificada como corrente paralela dos livros da Bíblia. O fato de serem os Provérbios de Salomão, em grande parte, completamente idênticos aos da velha Doutrina de Sabedorias, do antigo estadista egípcio Amenemope (cerca de mil anos antes de Cristo) deveria chamar particular atenção, comenta Goldammer (Die Bibel und die Religionen, in: Fuldaer Hefte, Schriften des Theologischen Konvents Augsburgischen Bekenntnisses, organização de Friedrich Hübner, caderno 16, Berlin und Hamburg, p. 104).

O que constatamos no Velho Testamento por meio de aspectos ligados à história das religiões, não podemos absolutamente excluir com relação ao Novo Testamento. Antes de tudo, aprendemos com Harnack, Uetzmann e Bultmann, entre outros teólogos destacados, que a religião cristã também ficou e ficará submetida a processos de aculturação, da mesma forma como outros credos. É evidente que as raízes do Cristianismo encontram-se nÓ Judaísmo. Isso comprovam o culto e a ética, cujo fundamento são as escrituras do Velho e do Novo Testamento, a lei e os profetas.

Eusébio de Cesaréia, em sua História Eclesiástica, transmitiu-nos uma idéia bem clara da tradição em vigor na comunidade primitiva de cristãos em Jerusalém, enraizada no culto judaico. No esquema científico que vigora na Teologia, estes cristãos primitivos figuram na rubrica de hereges (Lietzmann, p. 191). Eusébio os chama de ebioneios (no vernáculo: os pobres), porque tinham apenas uma idéia muito modesta e vaga de Cristo. Consideravam-no um homem comum, filho de Maria, que o pariu depois de ter tido relações sexuais com um homem, mas que, devido a seu caráter exemplar, foi declarado um justo. Em plena conformidade com a religião mosaica, defendiam a estrita observação da lei, rejeitando a idéia de poderem os homens ser justificados por Deus apenas por crerem em Cristo. Praticavam a religião-cerimonial da rigorosa observação da lei, como todos os judeus. Rejeitavam o ensinamento de Paulo, a quem consideravam um apóstata que havia traído a crença dos antepassados. Reconheciam exclusivamente o "evangelho aos hebreus", evangelho que não pertencia ao "cânon" dos livros reconhecidos, menosprezando os outros evangelhos (canônicos). Celebravam o Sábado no templo e observavam também o Domingo comemorando a ressurreição do Senhor. Não é de estranhar que essa comunidade primitiva dos ebionitas, emergida da comunidade dos discípulos de Jesus na capital, suspeitasse ao máximo do desenvolvimento da cristandade e que afinal a evolução passou por cima dela, como observou Lietzmann (Anfãnge, p. 184).

Pode-se perceber como começa a polêmica entre as distintas tendências que emergiram do novo movimento religioso dos cristãos. Há um entusiasmo extático versus sabedoria helenística, como também há a tradição judeu-cristã de Tiago cuja continuação era o semijudaísmo do apóstolo Pedro versus a proclamação da liberdade ensinada por Paulo: Para a liberdade foi que Cristo nos libertou. Permanecei, pois, firmes e não vos submetais de novo ao jugo da escravidão! (Gal. 5,1). Demorou, porém, até que a corrente paulinista - fortemente apoiada pelo movimento marcionista - se consolidas-se mais ou menos no seio da igreja. Consta que, neste processo, o elemento essencialmente judaico do Cristianismo mostrou uma impressionante assiduidade: acontece que a comunidade cristã da capital do Império, a cidade de Roma, herdou sua liturgia da sinagoga. O tríplice sanctus, sanctus, sanctus, a laudatio da ordem do universo, as diversas preces que se cantam ou falam na missa, tudo isso provem do culto judaico. Além disso, o catolicismo primitivo gradativamente assimila também elementos do helenismo, como o sacramentalismo e a mística espiritual, e a idéia da salvação devido ao sacrifício de Cristo, etc., como registra Lietzmann (p. 233-234).

No seu tratado Diálogo com o judeu Trifão, constata Justino que Sócrates e Platão eram precursores de Cristo, em pé de igualdade com os profetas do Antigo Testamento. E continua: Deus agiu em todos os tempos e entre todos os povos. Por meio de Cristo, deu-lhes desde sempre e também fora do povo de Israel fragmentos e bocados de sua verdade. Por isso é lícito dizer que todos os homens que viveram em conformidade com a razão eram cristãos, seja entre os gregos, por exemplo, Sócrates e Heráclito, seja entre os bárbaros por exemplo, Abraão, Elias e muitos outros. Também a escola da stoa fala de um logos spermaticos, semente espalhada entre toda a humanidade. Para Justin, Cristo foi o logos, ou seja, a razão divina, em pessoa.

A história do judaísmo mostra como se constitui, passo a passo, dos elementos de uma primitiva religião de nómades cheia de elementos provenientes de um animismo arcaico, uma prestigiosa religião de caráter monoteísta que assimilou elementos bem diferentes. Da mesma forma, não pode haver dúvidas de que também o jovem movimento cristão assimilouos mais diversos componentes do mundo contemporâneo num processo de formação secular. É claro: a lei da evolução que aplicamos ao setor profano não deve e nem pode ser excluída no contexto do fenômeno do Cristianismo.

Ao analisar os respectivos setores da história das religiões e das fontes que com eles correspondem, reconhecendo as respectivas relações e correlações, parece bem lógica a observação de Gunkel: o Cristianismo acaba sendo uma religião sincretista (Zum religionsgeschichtlichen Verstãndnis des Neuen Testaments).

Foi na Assembléia Mundial do Conselho Mundial de Igrejas em Nova Delhi (1961) que se afirmou: independentemente do caráter de nossas Cristologias ou Budologias, fica o importante fato de que se encontra detrás de todas as religiões a própria religião, acompanhada pela consciência religiosa do ser humano (K. J. Saunders - Christentum und Buddhismus, vide W. Andersen, Die theologische Sicht der Religionen etc., Fuldaer Hefte, caderno 16, p. 28) Até Karl Barth não ignorou o fenômeno que indica que os homens obviamente se sentem vis-à-vis de elevados poderes sobre a sua vida e sobre o mundo, e que os influenciam. Não ignorou que os homens sentem o compromisso de honrar o deus ou os deuses por meio de cultos, mistérios, símbolos, sacrifícios, orações, ritos, costumes e pela instituição de comunidades ou igrejas. Não negou que se procurou a voz divina na veda dos hindus e na avesta dos persas. Na tripitaca dos budistas, no Alcorão, que para o crente do Islã tem o mesmo significado que a Bíblia, o Velho e o Novo Testamento para o cristão. Não ignorou que certos elementos e problemas das religiões, tais como o começo e o fim do mundo, a origem e o caráter do ser humano, a lei moral-religiosa, o pecado e a salvação, parecem ser idênticos à doutrina cristã. Em última instância, porém, Barth não consegue reconhecer o fator da theologia naturalis, senão, muito ao contrário, critica a correlação que existe entre a religião e o homo religiosus, por ser este um ente problemático, completamente inconflável. Para Barth, tudo isso é Antropologia e como tal, falta de fé.

Num artigo em torno da revelação natural - Die Frage der natürlichen Offenbarung - afirma Bultmann que havia - extra Christum - uma noção de Deus no contexto da noção do homem sobre a própria existência. Da sua própria fraqueza ou impotência deduzia o homem o poder ou até a omnipotentia de Deus; em função dos desafios que ele teria de enfrentar, o homem possuía uma noção de sua própria responsabilidade perante o ente supremo, e sua própria transitoriedade e mortalidade levá-lo-ia a desenvolver a idéia da eternidade de Deus.

Sabemos que na doutrina católica sempre se manteve o princípio antigo: gratia non tollit naturam sed perflcit. Gratia praesupponit naturam, non destruit naturam. Martin Werner, que defende um realismo crítico, avança ainda mais quando afirma: com a proclamação da pessoa histórica de Jesus como o único, exclusivo e absoluto lugar histórico da revelação divina, nos atribuímos uma interpretação da historia da humanidade inteira, para a qual não temos nenhuma legitimação. Obviamente Deus não se revela exclusiva-mente por meio de homens santos e espiritualmente vultos, ou mediante sacerdotes e profetas, de babalorixás e pajés, mas, muito ao contrário, age durante a história inteira e no mundo inteiro, desde Geze, no antigo Egito, até Machu Picchu, no Peru.

Temos de reconhecer que Deus, que para nós se revelou através da História e por intermédio de pessoas santas - ou até de uma só pessoa santíssima, - que este Deus seja capaz de se revelar no mundo afora da cristandade também de outra maneira, além da História ou sem a História, e quiçá até contra a História. Como disse Devanandan, Trends of Thought in Contemporary Hinduism, há 60 anos: li we believe that ali new creation is in Christ, the dynamic rejuvenation of Hinduism now in the process is the work ofthe Holy Spirit. Não temos o direito de tratar a maneira dos não-cristãos de lidar com a revelação como ficção ou algo parecido à feitiçaria, destacou Gerlitz.

Em 1963 foi lançado um livro considerado revolucionário, Honest to God, de autoria de um bispo anglicano, John A. T. Robinson. Antes da edição do livro RobinsQn havia entregado à redação do "Observe?* um artigo que saiu sob o título agressivo: Our image of God must go. Este título havia sido formulado pela redação da revista, não pelo autor. Este tinha posto o título: A new Mutation in Christianity. Com isto, Robinson queria chamar a atenção para o fato de que, mais uma vez, no decorrer do tempo, haviamos chegado a uma nova fase de desenvolvimento da longa história do Cristianismo. A mensagem do bispo foi aplaudida pelo público como uma espécie de catecismo para pessoas secularfzadas.

Escrevia meu livro - afirmou Robinson - porque me considerei uma pessoa comprometida com Cristo e, ao mesmo tempo - sem a mínima possibilidade de recua - comprometida com esta sociedade secuiarizada de nosso século. Escrevia o livro na certeza de que ambos os fatores ou aspectos mereceriam um compromisso total, rebatendo ao mesmo tempo a hipótese de que estas duas realidades poderiam ser incompatíveis. Deus ficou cada vez mais marginalizado. Só foi admitido em vacant places left, em lugares vagos. Transformamos Deus em algo como "suplente", como asseverou Bonhoeffer. Afastamos Deus até a margem da vida, ou seja, o papel Dele fica restrito às coisas sub specie aeternitatis - quer dizer, o papel Dele fica relacionado à hora da morte. Um mundo no qual valem apenas as regras da causalidade não dispõe mais de lugar para Deus. Deus só pode sobreviver em espaços meio clandestinos ou em nichos reservados. No tempo dos astronautas já não restam mais vacant places left. Não há mais espaço vital para Deus. É por isso que conclui Bultmann: depois que Deus tornou-se Deus além do mundo, somos hoje incumbidos de achar Deus no meio deste mundo, na hora presente. O antagonismo entre a vida terrestre, isto é, entre o presente e outro mundo, ou seja: o além de nós deve ser superado. Só a idéia ou a imagem de Deus será capaz de encontrar bem aqui, neste mundo mesmo, aquilo que se imagina estar no transcendente, do lado do além. Só assim vai ser viável e possível, como uma chance para o homem moderno, encontrar neste mundo mesmo aquilo que se imagina estar no transcendente (Bultmann, 1964, p. 4ss). O Deus propagado pela tradicional teologia popular é apenas uma projeção. Quiçá sejamos nós chamados a viver sem esta projeção. De fato, isto não é uma proposta atrativa, pois sem dúvida alguma produz o sentimento de tornar-se órfão (Robinson, Honest to God, p. 18).

Esta posição de docta ignorantia, como gostaria de dizer com Martin Werner, une Robinson com Bonhoeffer, que referiu um Cristianismo sem religião. Como Karl Barth, para quem a religião era pura falta de fé, também Bonhoeffer chamou o adepto da religião um feio egoísta burguês, gozando a sua salvação metafísica. Para Bonhoeffer, um Cristianismo sem religião exigia um cristão maduro, cuja tarefa era enfrentar a vida numa condição etsi deus non daretur - sem que Deus esteja presente. Deus nos faz entender que deveríamos nos comportar como gente que deve enfrentar a vida sozinha, sem poder recorrer a Ele. Na opinião de Bonhoeffer, Deus chamou-nos para viver com um tipo de Cristianismo que não dependia das premissas da religião, da mesma forma como Paulo tinha chamado os homens do século I para viverem num tipo de Cristianismo que não dependia da circuncisão (Robinson, Honest, p. 23). Do mesmo jeito também o cristão de nosso século deveria confiar em Deus sem possuir uma idéia exata da sua existência. Isto implicava também numa fala mais modesta e reservada acerca de Deus.

Bonhoeffer compara o cristão moderno com o rapaz da parábola do filho pródigo que deixou a casa paterna por decisão própria. Bonhoeffer, contudo, troca os papéis dos estadistas: é Deus, diz ele, que manda o filho embora. E lá fora, o filho maduro tem de assumir toda a responsabilidade por tudo que faz ou deixa de fazer. O pai não o protege, opai não está presente. O mundo moderno é o mundo do qual Deus se retirou. Os homens têm que viver neste mundo secularizado etsi deus non daretur. Somos chamados a enfrentar os desafios e desaforos do mundo moderno sem que Deus nos dê uma mão. Somos completamente independentes. O Deus que está conosco é aquele que nos abandona (Marcos 15,34 - Deus meu, por que me desamparaste?). Deus deixa acontecer e nenhuma prece o faz parar. (Neuenschwander Die mündige Welt ais Aufgabe der Theologie, Schweizerische Theoiogische Umschau, Nr.2, 3Ø. ano , Bern, 1960, p. 109).

O que acontece é a dissolução de um mundo velho e o emergir de um mundo novo. Devido ao moderno trânsito aéreo, as distâncias geográficas tornaram-se relativas. Fazendo uso de satélites, a tecnologia, que facilita a comunicação audiovisual de maneira quase incrível, transforma também a autoconsciência dos homens em todas as regiões do globo e dissolve o primado dos europeus da mesma maneira como o colonialismo, produzindo uma cultura global da humanidade. Não fazem falta, porém, também as vozes que registram o perigo de uma desumanização radical ou a falência do pensamento humanitário diante de um processo que poderia levar a uma progressiva substituição do homem pela tecnologia, motivada pela automatização e cibernética. Resta a pergunta sobre qual será o papel do protestantismo neste processo irreversível e cada vez mais acelerado da secularização.

A preocupação acerca de nosso futuro não é um problema apenas do protestantismo; trata-se de um problema da cristandade inteira, como observou Zahrnt (Zahrnt, Glauben unter leerem Himmel, Em Lebensbuch, München 2002, p. 30). Em um artigo sob o título Existirá ei cristianismo en el siglo XXI?, o teólogo católico espanhol Enrique Miret Magdalena (Ei País, 10.9.1999) pronunciou-se sobre esta problemática. Ele parte da questão, se a mensagem de salvação que Jesus transmitiu aos homens de seu tempo seria de fato a única mensagem religiosa da salvação. E continua perguntando se a Bíblia de fato poderia ser considerada o único livro santo autêntico, ou se esta mensagem revelada também se manifestaria nas vedas, por exemplo, e se Jesus poderia ser considerado a única pessoa divina, ou se talvez também tenha outras pessoas às quais poderíamos, de certo modo, chamar de Jesus por serem elas mediadoras de uma mensagem que também provém de Deus. Não poderia, eventualmente, ser possível, pergunta o autor, que a mensagem fundamental - aquilo que para os cristãos significa Jesus como centro da salvação -, quiçá em outras palavras e de outra forma, se encontre também em outros livros, em outras culturas considerados escrituras santas, como as vedas dos hindus, ou no contexto de Confúcio?

É muito interessante o que é dito numa Carta Pastoral dos bispos do Vietnã, de outubro de 2003: A fim de que a verdade do evangelho se torne mais transparente, mais clara e aceitável, temos que usar meios que sejam mais apropriados e compreensíveis para a gente de hoje. Isso significa que se use termos e expressões que correspondam com a cultura e psique do homem moderno (Weltkirche, 9/2003). Parece que na Igreja Católico Romana se abre um novo capítulo para tornar realidade o complexo relacionado à inculturação e aculturação, deixado de lado desde o Vaticano II.

Dentro de um mundo globalizado, com uma sociedade pluralista, na qual não existe muralhas entre uma esfera religiosa e outra não-religiosa, em que não há terrenos específicos e marcados religiosos ou seculares nem há sanctum ou santíssimum vis-à-vis o profanum - aliás, uma evolução que corresponde totalmente com o princípio prdtestante - num mundo desses surge uma pergunta elementar e existencial: o que significará, no futuro, viver como um ser humano realizado, ter personalidade, representar a semelhança de Deus? (Loewenich, Die Aufgabe des Protestantismus in der Gegenwart, Schweizerische Theologische Umschau Nr.1, 350 ano, Bern, Junho de 1965, p. 4).

Exige-se que o cristão maduro seja comprometido com o mundo em que vive.

Keine Kommentare: